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Tombado, prédio abandonado em São Paulo tem fachada com moedas gigantes

Felipe Branco Cruz

23/01/2019 11h10

Prédio abandonado no Centro de SP tem fachada com moedas gigantes (imagem: Felipe Cruz)

No início do século 20, a região da Sé, em São Paulo, concentrava as sedes dos principais bancos do Brasil. Até hoje, o trecho entre as ruas Boa Vista e Líbero Badaró abriga prédios que remontam àquela época áurea, hoje transformados em centros culturais, como edifício Altino Arantes (o Banespão), atualmente pertencente ao banco Santander, e o Centro Cultural Banco do Brasil. A B3 (ex-Bovespa, Bolsa de Valores de São Paulo), por exemplo, até hoje funciona nessa área.

Não à toa, desde 1992, 293 edificações em nove ruas da região foram tombadas pelo Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental da Cidade de São Paulo, o Conpresp. Mas essa proteção não garantiu que as construções estivessem a salvo do abandono.

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Infelizmente, um desses exemplos é um edifício na rua João Brícola, 59/67 (ao lado da BM&F e bem pertinho do Banespão), que possui uma das fachadas mais bonitas e interessantes do centro de São Paulo, especialmente para os colecionadores de moedas. A fachada serviu, inclusive, de cenário para a série "3%", da Netflix (leia mais lá embaixo).

A imponente fachada ostenta uma porta de ferro com 13 moedas douradas gigantes de réis e cruzeiros que remetem ao final do século 19 e início do 20. Os medalhões reproduzem moedas desde a época do Império até a República, com o cruzeiro. A mais recente delas é a de 20 centavos de cruzeiro, dos anos 1940.

O local, no entanto, aparenta estar abandonado e, em 2017, cerca de 200 moradores de rua tentaram invadi-lo, mas foram impedidos pela Polícia Militar. Até hoje, ainda é possível ver barracas montadas por moradores de rua embaixo da marquise, como essas que eu flagrei nas fotos que ilustram este post.

Detalhe das moedas em fachada de prédio de SP (imagem: Felipe Cruz)

História do prédio

Como colecionador de moedas, fiquei curioso em saber como um prédio tão imponente pode chegar a este ponto. Descobri que todas as empresas que foram donas do prédio tiveram uma infeliz sucessão de fracassos econômicos.

Como ele é tombado pelo patrimônio, busquei essas informações direto na fonte. Liguei para o DPH (Departamento do Patrimônio Histórico de São Paulo) e fui atendido pelos pesquisadores Walter Pires e Fátima Antunes, que prontamente me ajudaram a levantar a história do lugar. Aliás, deixo aqui meu agradecimento a eles pela excelente pesquisa que realizaram.

Por causa da sua fachada, o prédio já foi erroneamente chamado de "Casa da Moeda". A instituição, no entanto, nunca funcionou ali. Com a ajuda de Walter e Fátima, descobri que as moedas não constavam do projeto original apresentado à prefeitura e foram adicionadas depois.

O prédio de 11 andares foi construído entre 1953 e 1955 pela empresa Leandro Dupré Construções com projeto de Gustavo R. Caron para o Banco Itaú, quando ele ainda pertencia aos primos José Balbino de Siqueira e Joaquim Mário de Souza Meirelles. A sede do banco funcionou ali, pelo menos, até 1964.

Quando o banco Itaú foi vendido para a família Setúbal, sua sede foi transferida para outro lugar e o prédio foi desocupado. A partir da década de 1970, ele foi ocupado por outras instituições financeiras.

Fachada tem reproduções de réis do Império e cruzeiros (imagem: Felipe Cruz)

Situação atual

De acordo com informações do DPH, o prédio consta como propriedade do Banco Interestadual do Brasil, do grupo J. J. Abdalla, que foi um dos maiores conglomerados empresariais do país, extinto em 1989.

Porém, a informação mais recente que encontrei foi no processo de reintegração de posse do lugar, movido em 2017 pela empresa Porto 25 Administração, Empreendimentos e Participações Ltda, que reclama ser a atual proprietária. Ela alegou na Justiça que o local não poderia ser ocupado por sem-tetos porque tinha valor histórico e era tombado pelo patrimônio. O processo dizia, ainda, que o local seria locado para terceiros para a realização de uma produção artística, o que de fato ocorreu com as gravações da série "3%".

Encontrei ainda um anúncio de aluguel de salas comerciais no prédio, em nome do Banco Clássico. Não sou corretor de imóveis, mas basta ver as fotos que eu fiz lá da fachada para saber que o lugar precisa de uma booooa reforma, com vários vidros quebrados.

No portão lateral do prédio, há uma placa informando que o local seria reformado pela empresa Teto Construtora. Liguei nesta empresa e falei com o arquiteto responsável pela obra. Infelizmente, ele me disse que os proprietários do prédio não levaram adiante a reforma e que a Teto não é mais a responsável pela obra. O arquiteto também não quis me informar quem eram os atuais responsáveis pelo lugar.

Independentemente de quem seja o proprietário, vale lembrar que o prédio é tombado pelo patrimônio histórico. Ou seja, sua arquitetura é importante para a cidade de São Paulo e, como tal, deve ser preservada. Tomara que os atuais proprietários reformem e valorizem o lugar.

Série "3%"

No meio de tanta notícia desanimadora, uma curiosidade sobre esse prédio que indica que os proprietários, de alguma forma, estão tentando fazer alguma renda com ele.

A rua, a fachada e o saguão principal serviram de cenário para algumas cenas da segunda temporada da série "3%", da Netflix, que foi ao ar em 2018.

A série "3%" é ambientada em um futuro distópico e a escolha dessas locações, como a fachada com seus medalhões e o imenso portão de ferro, combinou com o clima sombrio da história.

Veja as fotos:

A série "3%", da Netflix, usou o saguão do prédio como locação (imagem: reprodução)

Personagens da série "3%", da Netflix, entram no prédio (imagem: reprodução)

Fachada do prédio:

Prédio está abandonado e moradores de rua acampam em frente (imagem: Felipe Cruz)

Fachada ostenta uma imponente porta de ferro e pé direito alto (imagem: Felipe Cruz)

Detalhe das moedas expostas na fachada do prédio (imagem: Felipe Cruz)

No detalhe, a efígie do imperador D. Pedro 2° (imagem: Felipe Cruz)

As moedas expostas na fachada vão até o ano de 1948 (imagem: Felipe Cruz)

A entrada do prédio conta também com um portão de ferro (imagem: Felipe Cruz)


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Sobre o Autor

Felipe Branco Cruz coleciona moedas e curiosidades. É jornalista com mais de 10 anos de experiência, com passagem pelos principais veículos de comunicação do país. Atualmente é repórter de entretenimento do UOL, onde escreve sobre cultura pop, música, cinema e comportamento.

Sobre o Blog

Cara ou Coroa é o blog de numismática do UOL. Por aqui você encontra reportagens e curiosidades sobre as cédulas e moedas do Brasil e do mundo.

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